“Inquietavam-se as terras do Oeste sob os efeitos da metamorfose incipiente.Os Estados ocidentais sentiam-se inquietos como os cavalos antes da trovoada. Os grandes proprietários inquietavam-se, pressentindo a metamorfose, sem atinarem, no entanto, com a sua natureza. Os grandes proprietários atacavam o que lhes ficava mais próximo: o governo de poder crescente, a unidade trabalhista cada vez mais firme; atacavam os novos impostos e os novos planos, ignorando que todas essas coisas são efeitos e não causas. As causas escondiam-se bem no fundo e eram simples – as causas eram a fome, a barriga vazia, multiplicada milhões de vezes, fome na alma, fome de um pouco de prazer e de um pouco de tranquilidade, multiplicada milhões de vezes; músculos e cérebros que ansiavam por crescer, trabalhar, criar, multiplicados milhões de vezes. A última função clara e definida do homem – músculos que querem trabalhar, cérebros que querem criar algo além da mera necessidade – isto é o homem. Construir um muro, construir uma casa, um dique, e pôr nesse muro, nessa casa, nesse dique algo do próprio homem, é retirar para o homem algo desse muro, dessa casa, desse dique. Obter músculos fortes à força de movê-los, obter linhas e formas elegantes pela concepção. Porque o homem, ao contrário de qualquer coisa orgânica ou inorgânica do universo, cresce para além do seu trabalho, galga os degraus das suas próprias ideias, emerge acima das próprias realizações. É isto o que se pode dizer a respeito do homem.Quando as teorias mudam e caem por terra, quando as escolas filosóficas, quando os caminhos estreitos e obscuros das concepções nacionais, religiosas, económicas, se alargam e se desintegram, o homem arrasta-se para diante, sempre para frente, muitas vezes cheio de dores, muitas vezes pelo caminho errado. Tendo dado um passo à frente, pode voltar atrás, mas apenas meio passo, nunca o passo todo que já deu. Isto se pode dizer do homem, dizer-se e saber-se." (As Vinhas da Ira, John Steinbeck, página 154-155)
Todo um livro que, a curto e grosso modo, expõe uma análise concreta e genuína a um período determinado da vida do povo norte-americano. Contudo, e é de realçar este facto, toda esta análise é transversal ao período que abrange a luta de classes. Surpreendeu-me? Sem dúvida! O filme é magnífico, a escrita é inqualificável. Faço uma citação de um fragmento do livro, mas podia (ou devia) fazê-lo na integra. Todo o livro tem um exame muito profundo às contradições da sociedade da época. Steinbeck escreveu este livro, não como um relatório, nem como uma dissertação, mas como um romance. Inqualificável.
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