terça-feira, 3 de junho de 2014

Contemplar o Skateboarding: Centelhas da vida



Recordando o Skate.

Em mim, há todo um revivalismo. 
Intrepidez. Vertigem em tons de asneira. Puxar de um cigarro, prancha no pé e lanço de escadas a dar-lhe três quatro cinco metros, rumo à aventura. Havia sabor de juventude nos desafios à gravidade, enquanto ouvíamos e ouvíamos e ouvíamos At the Drive In, e enquanto ouvíamos e ouvíamos e ouvíamos, o cigarro mingava, o J. fazia-se à atmosfera, foguetão rumo à electricidade da queda.
Na escola, um gajo com «cabelo à foda-se», «cabelo à beto», dizia-nos encarecidamente
«skate é para podres»
Beto, surf, «cabelo à foda-se», PPM a tons de azul e branco
«skate é para pobre
Vai-te foder filho da puta.

Skate que se praticava em Lisboa era skate de becos, traseiras, betesgas mal amanhadas. Skate como arte de imaginação. Transformar o meio urbano para a prática dos saltos com prancha. 
Vizinhos, gente com cabeça raquítica, bófia
(alguém ainda usa o termo chuis?)
Havia alguém que reconhecesse o valor do skateboarding?
Não nos interessava. Desde que o J. saltasse o que tinha de saltar, desde que me espetasse onde tinha que me espetar, o mundo girava com toda naturalidade. 
Vejam o skate. Vejam com olhos de ver. Há transformação do quotidiano. Há novas formas e novos caminhos e novas visões da cidade urbana. Há toda uma imaginação condensada em pés, prancha e voo. Há coragem e estupidez. Inseparáveis. Tanta burrice em quem parte o braço e está pronto para outra tentativa. E quando um gajo tirava um «coelho da cartola»? Todo um grupo eufórico. Cada vez mais estímulos para tentar o impossível. O J. saltar um  lanço de três quatro cinco metros, aterrar sobre a prancha com ar de «no pasó nada», e todos nós aos pulos. 

Para finalizar, um pequeno apontamento. 
Consciência de classe? Só na minha cabeça. Naquele tempo, quer houvesse ou não consciência, andar de skate era uma questão de classe. Andar de skate era não recear partir os punhos e era não recear as proibições e os preconceitos. 

Um bem haja às memórias que guardo do Skate. 

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