Recordamos o livro «Os Sequestrados de Altona», de Sartre, e assalta-nos à cabeça uma imagética: o tribunal de caranguejos que julgarão, à luz do passado, a humanidade. No rodopio da imaginação, sonhamos com magistrados-crustáceos gigantes com antenas perscrutadoras da verdade, e no foco do julgamento uma trupe de gente mirrada, olhos hesitantes, rubor de bochechas. Chamados à audiência, como tantos outros que já foram e tantos outros que ainda o serão, os jornalistas.
Sem processo kafkiano, um julgamento célere:
CULPADOS
Vós sois CULPADOS
A mentira tem perna curta.
O revisionismo histórico tem perna curta.
A deturpação, corrupção, logro, intrujice, filha da putice, tudo com perna curta.
E somos nós que vos encurtamos as pernas. De passo em passo, vão de encontro à sentença: culpados.
Para quem desenvolveu consciência sobre o assunto, percebe que a comunicação social faz parte da máquina repressora de um Estado digno do que é: um Estado. Não há novidade. Muitos intelectuais se debruçaram sobre a matéria [1].
Éramos uns pirralhos quando a professora
stôra
senhora professora doutora
sobreexcelência chanceler eminência
vaquinha cabrinha putinha
nos dizia, da sua perspicaz erudição académica, que o «poder está na comunicação social».
Está? Sabemos que não. Como a mentira, a ideia estúpida também tem a perna curta. A comunicação social é um tentáculo, e não o polvo em si. Há outros tentáculos: justiça, segurança, instituições estatais, etc.. Perguntamo-nos: mas o Estado é o fim em si? Obviamente que não. O Estado é uma abstracção de algo que o supera. O Estado é um vassalo da intencionalidade. Sejamos directos: o Estado burguês é um instrumento do Grande Capital. Outros Estados serão instrumentos de outras intenções. Em remate, afirmamos convictamente que a comunicação social é uma vassala de uma hierarquia de vassalagem. Mas se a comunicação social é o que é, então é justo prolongar a sentença aos assalariados jornalistas? E é aqui que escorregamos na dúvida. Se por um lado compreendemos que os assalariados também são vítimas, por outro lado ficamos indignados com o papel que representam. Dentro da classe dos jornalistas, há quem se esforce para repôr a honestidade da profissão. Os outros, a maioria, continuam a abandalhar as responsabilidades. E esses trazem as mãos enxaguadas em sangue. São carrascos. Espalham a mentira. Morrem milhões e as notícias fluem nos alardes da mentira. Carrascos.
Aos que abandalham as responsabilidades, alagados de pútrida morte, não terão julgamento com crustáceos gigantes. Não serão caranguejos a julgar a humanidade. Serão os homens, com as suas vozes humanas, com dedos humanos em riste, com consciência humana, que dirão, à trupe dos mentirosos:
CULPADOS.
[1] Recomenda-se a leitura de Manufacturing Consent de Edward S. Herman e Noam Chomsky
Imagem retirada daqui
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2 comentários:
Somos todos culpados, vassalos, tentáculos... enquanto não tivermos os nossos dedos em riste e mudarmos a natureza [de classe] dos carrascos.
Outro texto interessante além desse do Chomsky é o A Formação da Mentalidade Submissa... http://resistir.info/varios/mentalidade_submissa.html
O PIG (Partido de Informação Golpista, na clandestinidade) vai colocar seu blog na lista dos "a abater"!
O Bruno deixa sempre uma (outra ponta) ponta... boa parelha, portanto!
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